O passado mês de Novembro, encerrou mais uma época do desporto motorizado nacional e internacional. Por cá Armindo Araújo, aos comandos do Citroen Saxo, conquistou pela segunda vez consecutiva o título de Campeão Nacional de Ralis. No todo-o-terreno, o título foi para Rui Sousa aos comandos da Nissan Navarra. Escrevo sobre estes dois recém coroados campeões, por competirem nas competições com mais expressão em Portugal e por consequência as que mais facilmente poderiam projectar um piloto na alta-roda mundial. De facto, no todo-o-terreno temos um Campeão do Mundo, Carlos Sousa, que deu à Mitsubishi um título feito de mérito e preserverança mas que não foi suficiente para lhe garantir lugar na equipa, para a participação no Paris-Dakar. A exclusão de Carlos Sousa da equipa, ganha ares de absurda ao ser anunciada a contratação do Espanhol, «Nani» Roma, vencedor do Dakar no ano passado, mas de moto. Assim, temos um experiente campeão do mundo apeado por troca com alguém que já andou no deserto mas apenas com duas rodas. À primeira vista, parece uma cena dos «apanhados» , mas um olhar mais atento revela que o piloto espanhol é patrocinado por uma gasolineira, com alguns milhões de euros para gastar, o que para os patrões da Mitsubishi faz toda a diferença.
Olhando para os ralis, tivemos este ano Miguel Campos a participar em algumas provas do Campeonato do Mundo, num mini-programa proporcionado pela Peugeot. Os resultados iniciais bastante modestos, aceleraram a guilhotina sobre a cabeça do piloto que não só não podia falhar, como tinha ainda o peso de ter de mostrar qualidades, em provas em que a inexperiência raramente perdoa. Se todos sabemos que em alta competição o mais pequeno erro se paga caro, também não é menos verdade que existe uma fase de adaptação e uma curva de aprendizagem, que quando respeitadas pagam dividendos elevados, normalmente com títulos.
O paradigma dos exemplos portugueses, terminou este mês uma gloriosa carreira, sempre ao mais alto nível, dá pelo nome de Carlos Sainz. Paradigma porque o «Rei» Carlos construiu a sua carreira contando sempre com o apoio do seu país e das instituições que através dos patrocínios e de numa gestão de carreira exemplar, lhe permitiram crescer e aprender até atingir a maturidade suficiente para disputar e conquistar dois títulos mundiais. Mas não é só de patrocínios que se faz uma carreira e Carlos Sainz foi sempre magistral naquilo que dele dependia, foi um pioneiro, apostando desde cedo no profissionalismo como via para atingir o sucesso. Num tempo em que ser piloto, era ser predestinado ou possuidor de algum dom, Sainz soube contrariar tudo e todos com trabalho exaustivo com os mecânicos e engenheiros, sendo o primeiro a perceber de facto como é que o carro funcionava, com trabalho físico por forma a resistir fisicamente a provas cada vez mais duras e testava tudo sempre mais e mais, num exercício meticuloso e exaustivo. Também fora do carro soube cultivar a carreira, na educação e amabilidade, sempre disponível, de postura impecável, transformando-se num embaixador do desporto motorizado, colocando-o no segundo lugar das audiências desportivas espanholas.
O que temos a aprender com o exemplo Sainz é que à medida que o país o foi apoiando na sua carreira, soube também crescer e evoluir, conseguindo inscrever um prova no campeonato do mundo de Ralis, dois circuitos permanentes nos mais importantes campeonatos internacionais, Formula 1, Moto GP, Superbikes, dois pilotos relevantes na F1, campeões do mundo de motociclismo e não pára por aqui. Certamente que Sainz não é responsável por isto tudo, mas certamente que ajudou a popularizar um desporto que à duas décadas estava no auge, em Portugal.
Posted in "Diário de Aveiro", 30.12.2004