Se no mundo automóvel alguém fosse galardoado com um prémio Nobel, certamente seria o Comendador Enzo Ferrari. Não só pelas maravilhas que criou sob o signo da Ferrari mas também por ter dado origem a outras maravilhas como a Lamborghini ou Ford GT40.
Se Ferrucio Lamborghini decidiu começar a construir automóveis depois do comendador lhe ter dito que ele só percebia de tractores, já o GT40 nasceu da raiva que Henry Ford II tinha ao italiano. Depois ter tudo acordado com este para que a sua companhia, na altura a maior do mundo, adquirisse a mítica construtora dos carros vermelhos, na altura em sérias dificuldades financeiras, Enzo, que jogava sempre em dois tabuleiros aos mesmo tempo, fechou um acordo com a FIAT para uma injecção de capital que lhe permitia continuar o negócio de forma independente, batendo assim de forma estrondosa, a porta na cara de Ford.
Enrraivecido, o primogénito do fundador das linhas de montagem em série, do topo do seu poderoso escritório em Detroit, ordenou que se fizesse um Ford que fosse capaz de humilhar os Ferrari nas 24 horas de Le Mans.
Apesar de ser o maior construtor do mundo, na Ford ninguém fazia ideia de como é que se construía um carro de motor central capaz de bater os enigmáticos carros vermelhos. Se hoje a semelhança entre um Ferrari e um carro americano se resume praticamente só às rodas, naquele tempo era quase como comparar um DC3 a um disco voador.
Na divisão europeia da Ford também ninguém podia ajudar, basta lembrar que apesar do poderio industrial, no início dos anos 60 andavam todos atarefados a construir coisas como o Ford Anglia.
Esta batalha idealizada pelo Henry Ford II era mais ou menos como se de repente, no mundo das canetas, a BIC decidisse combater a Mont Blanc, no seu nicho de mercado.
Como o dinheiro não era problema, fizeram a carroçaria e o chassis em parceria com a Lolla – basicamente pagaram a quem sabia da poda.
O motor, como não podia deixar de ser, era um preguiçoso V8 americano, primeiro com 4.2 L, depois com 4.7 L e como nada parecia resultar, ao terceiro ano apareceram com um 7 L, que cilindrou os pequenos V12 de 3 L da casa italiana, começando aí uma série de quatro vitórias consecutivas, que são ainda mais estridentes porque acabaram com uma série de seis vitórias da Ferrari.
O que sucedeu foi simplesmente a mais famosa história tipo David e Golias do mundo do desporto automóvel. À parte disso, criaram um carro muito bonito, talvez o mais belo carro americano – se ninguém se lembrar que foi desenhado em Inglaterra – e ainda por cima rápido e fiável. Ninguém sabe bem porquê, mas a Ford nunca produziu o carro em série, para o público fizeram para aí uns vinte ou trinta, vá-se lá perceber estes americanos.
A maior homenagem que se pode fazer à beleza do GT40 é a versão que a Ford lançou em 2004. Entre um e o outro vão quatro décadas de evolução, mas os designers não conseguiram mais do que actualizar alguns detalhes, tirando vantagem dos novos materiais e técnicas de construção. É que ao desenho original não havia mesmo nada para melhorar.